Amor à lá Carte
Hoje eu quero falar com você mulher empoderada. Vamos falar da nossa solidão? E com vocês também homens que sofrem de um mal chamado: “medo de se comprometer.”
Se tem uma coisa que ninguém fala é da solidão da mulher moderna. Atualmente somos cercadas de frases e textos motivacionais que nos impulsionam a ter coragem de dominar o mundo. Nos levam a crer que somos toda a potência que realmente somos, mas também nos ensinam a ser intolerantes. Sim, intolerantes. Nós mulheres fortes, somos bombardeadas o tempo todo por mensagens do tipo: “manda o boy lixo vazar”, “você merece mais”, “chama o próximo”, e tudo isso me faz pensar o quão líquida e superficial vão se transformando as nossas relações com os homens e dos homens conosco.
Hoje eu estive refletindo o quanto é tênue a linha que divide o que é realmente aceitável do que não é. A linha que divide o que uma mulher deve ou não deve tolerar em um relacionamento. Vivemos em uma sociedade machista, fomos criadas por mães e pais machistas em maior ou menor grau, mas todos machistas. O machismo vive em nós. Reconhecê-lo é o primeiro passo para desconstruí-lo. Lutamos diariamente pra findar o nosso valor e construir uma visão de mundo mais igualitário e justo para todas as mulheres. (Para todos os seres). Porém, não nos ensinaram que esse caminho é solitário. Os homens não estão preparados para tudo o que temos a dizer, eles fogem, e procuram aquelas que fingem que o machismo deles não as incomoda. Quando falamos de machismo muitos ainda imaginam a figura grotesca de um homem estupido e grosseiro. Mas o machismo vai além disso. Machismo não é só essa personificação de homem e também não está somente nos homens, está nas mulheres também. Está em mim. Está em você. Mas está principalmente na forma como nos relacionamos com o outro, na forma como enxergamos o mundo, o sexo, o corpo, a beleza, o trabalho, a saúde. Influência tudo.
Os homens também precisam se desconstruir e refletir suas posturas e crenças.
A reflexão é que fomos controladas por tanto tempo e feitas de objeto sexual para os homens que agora precisamos o tempo todo ouvir que somos deusas. O problema é que ao nos colocarem no patamar de deusas, precisamos de um Deus e isso é que tá difícil! Ninguém serve pra nós, ninguém é bom o suficiente, ninguém está a nossa altura. Ninguém atende as nossas exigências de mercado.
Até que ponto somos apenas mulheres empoderadas buscando reconhecimento e até que ponto estamos nos tornando tão intolerantes a ponto de não sabermos mais conversar com nossos parceiros e tentar concertar ou alinhar as coisas? Nós não falamos mais. Nós simplesmente vamos embora, viramos as costas e esperamos o próximo.
Não existe pessoa ideal. Existem pessoas dispostas a fazer dar certo. A ideia de ideal é uma ideia ilusória, uma neurose de insatisfação constante, que nos leva a crer que sempre terá alguém melhor pra nós, ali além das montanhas. Estamos com alguém pensando: “O que será que tem ali do lado?”, “Como será ficar com aquela outra pessoa?” E nisso nunca nos aprofundamos de verdade.
Nossa geração vive um mal da solidão eterna. Carentes, cheios de vontades, cheios de contatos, companhia as vezes, mas sempre solitários. Existe um medo tão grande de se relacionar e ser profundo que as pessoas estão sempre na defensiva, se esquivando e repetindo o tempo todo: “Eu não estou pronto pra namorar ou casar agora.” “Eu vim de um relacionamento muito difícil, estou muito machucado (a).” “Esperando a pessoa certa.” Bla bla bla
A nossa cultura favorece isso. Atualmente parece que é crime se declarar pra alguém. Você é considerado um (a) idiota se faz isso. Falar em namoro, compromisso... oi? Palavras proibidas. Pecado meu irmão!
“Vai ficando.” “A gente ta se conhecendo...” Conhece o corpo, conhece a alma, mas o ser não quer andar do teu lado, fazer planos junto com você. As músicas também refletem isso, é só prestar atenção em meia dúzia de músicas sertanejas e alguns funks que você vai ouvir: “Minha namorada ta em casa e eu to na balada”, “Vou ligar pros contatinhos e ele que se dane...” e por ai vai. Fazem parecer que ter um relacionamento é algo horrível, que ter alguém pra amar e compartilhar a vida é uma prisão. No fundo tudo gente vazia.
Essa lei do descarte, do deboche aos sentimentos e da grande oferta e procura no mercado humano, faz com que sejamos objetificados. Os aplicativos contribuem um pouco pra essa sensação de descarte. É fácil passar pro lado, descartar, ignorar, dar like. Deixamos de ter e de atribuir ao outro a condição de humanos que automaticamente possuem sentimentos. Somos seres sociáveis e isso é inegável. Temos a necessidade de nos relacionar, de partilhar e no fundo todos queremos ser vistos, notados, validados. Não é atoa que um like ou uma visualização se tornou tão valioso. Plataformas como Instagram e Facebook estão ai pra nos mostrar isso diariamente. Nesse jogo do não se envolver, as pessoas estão sempre prontas pra pular fora, nem entram, estão sempre prontas pra ver quem vai sacanear o outro primeiro, quem vai trair primeiro. Supondo que todo mundo é igual, que “se eu ja fui traído (a) todo mundo trai”, supondo que “se meu celular está cheio de contatinhos o do outro também está...” assim as pessoas tendem a ativar um mecanismo de defesa podre: “Vou sacanear primeiro antes que me sacaneiem.” E então temos a falsa sensação de estar a frente; protegidos.
Se tratamos o outro como um objeto, logo fica difícil atribuirmos a ele características humanas.
Em que momento nos perdemos tanto de nós a ponto de nos esquecermos de nossa humanidade? De nossas emoções? De nossos sentimentos? Não é possível que além de reinventar o tal do “parto humanizado” tenhamos que no futuro reinventar o relacionamento humano.
Reflitam! Nossa geração grita por socorro!
Thays Sousa da Silva,
Psicóloga Cliníca
CRP 06/136006
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